Vivendo a transição tecnológica

Viver essa era de transição tecnológica foi algo inusitado. Quando eu nasci as pessoas comuns viviam ainda uma realidade analógica. Sim, já havia computadores, mas suas aplicações eram pontuais e a influência deles no nosso dia a dia não era perceptível, ao menos não para uma criança.

Nasci em 1978 e cresci no ritmo dessa mudança tecnológica.
Vi as brincadeiras tradicionais se transformarem em jogos eletrônicos e a facilidade de ter acesso a um aparelho de TV aumentar.

Eu assistia desenhos animados e filmes sobre um futuro distante onde computadores estariam presentes a todo momento em nossas vidas, mas nem esses filmes puderam prever o quanto essa presença seria constante em tão pouco tempo.

Lembro que ainda com 5 ou 6 anos eu me maravilhava com o Tele Jogo que meu avô havia comprado para mim e meu primo jogarmos quando íamos visitá-lo. Eram jogos bem simples, mas que para uma criança da minha idade naquela época, eram o máximo.

Nunca tive um Atari, o console mais popular da minha infância, mas quando fiz 11 anos ganhei um Nintendo 8 bits. Ainda era 1989 e apesar dos jogos eletrônicos, ainda vivíamos num mundo analógico. Nada de internet e passávamos horas a fio nas filas de banco para pagar contas.

Antes disso, ainda com 9 anos, cheguei a fazer um curso de informática, mas ainda num computador antigo sem sistema operacional gráfico, então nos ensinavam a linguagem BASIC para darmos comandos primários. Não era algo muito atrativo e logo me desinteressei.

Então no início dos anos 90 os computadores caseiros começaram a se tornar acessíveis aqui no Brasil e pessoas com mais dinheiro começaram a ter os seus em casa. Lembro de ir à casa de um ou outro amigo cuja família tinha mais dinheiro, onde pude ter o primeiro contato com esses computadores já com sistemas operacionais gráficos que exigiam apenas que o usuário soubesse usar um mouse para usá-los.

Os computadores tinham deixado de ser meras ferramentas de trabalho que apenas especialistas usavam e passaram a ser bens comuns e fáceis de usar para tarefas corriqueiras.

Ainda na década de 90 eu relutava em ter um celular. Não apenas pelo preço de um aparelho desses na época, mas também porque eu não via necessidade. Estava acostumado a viver sem um.
Meus primeiros celulares foram aqueles tijolos pretos da Nokia, com capas plásticas e prendedores para pendurarmos na cintura.
Ambos de segunda mão doados por minha tia ao trocar por um modelo mais moderno. Ambos do tipo “pai de santo” como se dizia. Apenas recebiam ligações pois eu não tinha interesse em adquirir créditos para fazer ligações nem dinheiro para isso.
Mas eu já saía muito sozinho e esses aparelhos serviam para tranquilizar minha mãe a respeito do meu paradeiro.

Meu primeiro computador, e o primeiro da minha casa, foi adquirido em 1999, após ter entrado na faculdade, já que a partir dali se fazia necessário ter um aparelho desses para poder aprender a lidar com os programas que eu precisava conhecer para ser um profissional de design.
Era quase o que havia de melhor no mercado. Windows 95, 1Gb de HD e com modem para acessar a internet. Internet que já era popular, mas ainda discada e muito limitada. Usava a linha telefônica para se conectar a uma velocidade terrível e isso custava caro pois era cobrado o mesmo pulso de uma ligação comum. Então precisávamos nos conectar após certo horário para pagar menos, e não ocupar a linha para o caso de alguém querer ligar. Contudo, os e-mails foram se tornando cada vez mais comuns e facilitavam o contato com amigos.
Foi no teclado do computador que eu aprendi a digitar, e não em uma máquina de escrever.

Com o tempo, vi o mundo se abrir na tela do computador.

Logo chegou o Google, que tornou o mundo digital mais claro e, em seguida as redes sociais.
Hoje em dia adoro ter um celular, um computador de bolso que uso para lazer, trabalho e, claro, comunicação.
É difícil lembrar como era meu dia a dia antes de estar inserido no mundo digital.
A mudança foi rápida, aconteceu ao longo do meu crescimento e para quem tem mais ou menos a minha idade. Neste sentido sempre estive em sintonia com o Espírito do Tempo. Amadurecemos em sincronia com o digital.

Ainda crianças nos divertimos com inocentes jogos eletrônicos, que na nossa adolescência se tornaram mais violentos e sombrios, e já adultos tínhamos maturidade o suficiente para lidarmos com todo conteúdo, bom e ruim, disponível a poucos cliques de distância. Algo que gerou muito estranhamento para outras gerações, mas nas mãos de pessoas como eu era algo familiar como um amigo com o qual crescemos juntos.
A tecnologia foi perdendo as amarras e se tornando mais perigosa para quem não cresceu com ela. Mas sempre fui capaz de lidar com ela sem medo de cair, como ao andar em uma bicicleta sem rodinhas.
Volta e meia me pego pensando como tudo isso foi muito bem sincronizado. Meu amadurecimento e a evolução digital.
Tento imaginar o que ainda pode surgir e fazer com que me sinta em descompasso com essa evolução, como meus pais certamente se sentiram e muitos ainda se sentem. Talvez me sinta como as gerações mais novas que já nasceram num mundo digital, mas ainda sem maturidade ou uma cultura ao seu redor que os protegesse de cair ao tentar “pedalar sem as rodinhas”.

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