Uma breve análise minha sobre a narrativa dramática do quadrinista Chris Ware e uma recomendação de leitura das suas HQs.
Eu já havia ouvido falar no Chris Ware, mas somente no ano passado peguei uma HQ dele para ler, foi Rusty Brown pouco depois li o Building Stories.
Quem me empolgou para a leitura foi a Michele Nunes que está desenhando a Tupiniquins, minha próxima HQ.
– Quem é Chris Ware? –
Chris Ware é muito conhecido por seu traço cartunesco e minimalista com linhas precisas que compõem imagens claras inseridas em layouts bem peculiares e muitas vezes complexos.
Aliás, ele gosta de explorar ideias inusitadas em termos de layout de páginas de HQs.
Ele busca compensar os layouts complexos com as imagens claras dentro dos quadros, mas ainda assim eu não vejo suas HQs como portas de entrada para novos leitores.
Contudo, as histórias que ele narra são dramas cotidianos de fácil identificação.
A forma como ele escreve sobre eventos mundanos e muitas vezes banais é o que me encantou.
O Chris Ware consegue imprimir muita dramaticidade mesmo com seu traço simplificado.
Eu atribuo isso à sua grande habilidade em controlar o ritmo narrativo e tomadas de câmera.
Somos impelidos a contemplar os quadros e páginas chave de suas histórias e refletir sobre o que acabou de acontecer ali.
Assim, entendemos e criamos empatia pelos arrependimentos e desilusões dos personagens.
Não são poucas as passagens que me levaram de volta a momentos bem específicos da minha vida.
As memórias trazidas não são boas porque as histórias do Chris Ware não tratam de sentimentos bons.
As HQs do Chris Ware podem nos deprimir se as lemos num mau dia.
Deixo esse alerta.
Muitas vezes eu pude entender bem como o personagem estava se sentindo.
Lendo Rusty Brown e Building Stories foi interessante ver como o Chris Ware consegue costurar suas histórias umas nas outras.
Ambas as HQs possuem múltiplas histórias se desenrolando em simultâneo.
O protagonista de uma HQ se torna coadjuvante na seguinte e assim vamos conhecendo todos, por diferentes lentes.
– HQs Maduras –
Pela narrativa segura, os temas trabalhados e a forma como ele consegue puxar o leitor para dentro da trama, eu posso dizer que as HQs do Chris Ware estão entre as mais maduras que já li.
Dificilmente uma pessoa com menos de 30 anos conseguiria se identificar com a maioria dos sentimentos que ele retrata em suas obras.
São sentimentos que só quem já viveu certas frustrações, arrependimentos e desilusões consegue identificar.
Aos 46 anos eu ainda torço para não vir a me identificar com alguns dos personagens e eventos.
Tudo que falei pode parecer desencorajador para quem nunca leu essas HQs.
Contudo eu digo que valem a pena serem lidas pois nos levam a refletir sobre a vida.
Os mais jovens podem identificar ali boas lições.
Os mais velhos saberão que não estão sozinhos com suas cicatrizes.
Fico imaginando de onde o Chris Ware tira as inspirações para as suas histórias.
Se ele viveu metade do que narra ali, definitivamente soube aproveitar os limões que a vida deu a ele.
– Curiosidade –
Building Stories não foi publicado na forma de um livro, mas na forma de uma caixa com algumas das histórias em forma de revistas, outras em tiras ou pôsteres.
É uma forma bem inusitada que demonstra a versatilidade que os quadrinhos possuem.
Foi inspirado nisso que o ilustrador/quadrinista Marcio de Castro criou sua versão de O Cortiço.
Aqui tenho outras dicas de HQs e autores.