Fundação

Gostei muito da série da Apple Tv.  
Acho que é a primeira desse streaming que me agradou de fato. 

O visual como um todo remete bem às belas artes que já estamos acostumados a ver nas capas dos livros do Asimov e isso me agradou muito. 
Alguns puristas da obra do Asimov dirão que fugiu muito do original. 
Mas eu digo que fugiu para melhor. 
Ao menos essa primeira temporada está sendo um raro caso de adaptação que enriquece a obra original. 
O Asimov é famoso por não se importar em desenvolver seus personagens além do estritamente necessário para que a história seja contada, já que dentro das suas histórias os personagens não representam mais do que meios de explicar ao leitor o que se passa e suas ações que fazem a história progredir acabam sendo impessoais, basicamente qualquer outra pessoa naquela situação com mais ou menos aquelas habilidades faria o mesmo. 
Isso funciona nos livros, principalmente para fãs de ficção científica, porque o foco principal das histórias dele são as ideias trabalhadas e o contexto macro abordado. 
Porém toda a mensagem pode ser enriquecida por um drama cativante e isso só é possível quando trabalhamos os personagens dessas histórias e damos a eles identidades mais específicas com as quais possamos nos identificar e simpatizar. 

A série faz isso e não perde de vista o cerne da história e da mensagem que a obra do Asimov traz. 
 
Uma preocupação que eu tinha era com os saltos no tempo já que nos livros basicamente cada capítulo narra um evento com séculos ou décadas após o capítulo anterior com personagens totalmente novos. 
E geralmente séries de TV buscam manter os seus elencos fixos. 
Acho que a série encontrou uma solução bacana para esse problema e espero ver mais duas temporadas para termos um equivalente aos três livros originais. 

E agora entrando nos spoilers. 

A hibernação das duas protagonistas dessa primeira temporada garantiu um belo salto no tempo e deve ser o que vai permitir que elas sigam protagonizando a série por séculos dentro dessa trama. 

A ideia da dinastia genética do imperador também permitirá que vejamos aqueles mesmos atores interpretando os futuros imperadores nas próximas temporadas, se é que a matriz não foi destruída. 
Mas algo me diz que eles vão encontrar uma forma de contornar a corrupção da matriz e até mesmo a destruição da mesma. É possível que o Dawn atual se torne a nova matriz, mas suspeito que mais e mais clones “defeituosos” surgirão e isso vai desestabilizar ainda mais o império. 

Essa trama ajuda a explicar melhor as várias causas que levam um império dessa magnitude a colapsar, algo que o Asimov não aborda nos livros, ainda que ele tenha se inspirado na queda do Império Romano para escrever Fundação, o livro dele se foca apenas em mostrar os efeitos perceptíveis e gerais desse colapso e nos desafios que a fundação enfrenta para se manter viva até que seja possível começar a reconstrução da sociedade. As causas específicas do colapso são ignoradas e resumidas como uma incapacidade do poder central de manter o controle sobre todo o império, o que aos poucos gerou conflitos que cresceram e se tornaram revoltas que foram corroendo o império de fora para dentro. 

Mas a presença dessa trama imperial permite também que a série aborde questões que não estão no livro e que também são bem interessantes para o público de ficção científica. 

A tecnologia é muito melhor explicada do que nos livros. Na época o Asimov era até meio visionário em relação a algumas das coisas que seriam possíveis, mas ele não se preocupava em explicar como aquilo seria possível. A série lança mão do que sabemos hoje ser possível e tenta detalhar melhor como algumas das maravilhas do futuro podem funcionar, ainda que não entre em muitos detalhes e várias das tecnologias futurísticas fiquem sem explicação, o que não me incomoda de forma alguma porque estamos falando de milênios no futuro e de técnicas que sequer começaram a ser vislumbradas hoje. 

Uma coisa que me incomodou e ainda não se mostrou relevante é a presença da androide que serve aos imperadores. Ela é uma clara referência ao Daneel Olivaw que só aparece em uma das continuação dos livros da fundação e só é interessante para quem leu a série dos Robôs onde o Daneel é um dos protagonistas. E sua aparição pontual bem após a Fundação ter sido bem sucedida inclusive serve ao propósito de mostrar que ele de alguma forma ajudou se colocando a parte e não interferindo nos eventos que levaram ao desenrolar da história. E essa androide não segue muito as premissas do Daneel. Enfim, pode ser que isso venha a se pagar mais adiante. Por hora eu só a vejo como uma personagem que confunde o espectador incauto, que não sabe porque que os androides foram extintos, a título de inserir cenas com efeitos visuais bacanas.                   

Será que o Daneel ainda pode aparecer?  

Será que ela é uma versão do Daneel que tentou influenciar mais diretamente os rumos da humanidade e se corrompeu? 

Outra coisa que ficou como referência gratuita para os fãs dos livros é a presença dos spacers, que também foram extintos na série dos robôs e creio que teriam uma influência disruptiva na história da Fundação se fossem retratados conforme nos livros e não apenas como meras desculpas para efeitos visuais.    

Dito isso, espero que a série continue bem, apesar desses pequenos defeitos que apontei e que um dia possamos ver a série dos robôs a começar com Eu, Robô e em seguida a dupla Daneel e Elijah lidando com preconceito e o destino da humanidade em meio a vários mistérios. 

Forward the Foundation! 

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